Festa de Santo Estevão, Proto mártir
Elegerunt Stephanum, virum plenum fide et Spiritu Sancto – Elegeram Estêvão, homem cheio de fé e do Espírito Santo (At 6, 5)
Sumario. Eis ai o belo elogio com que a Sagrada Escritura presta homenagem às virtudes de Santo Estêvão: chama-o cheio de fé, cheio de graça, cheio de fortaleza, em uma palavra, cheio do Espírito Santo. Alegremo-nos com o santo Protomártir, e em seu nome demos graças a Deus. Volvendo depois os olhos a nós mesmos, vejamos se ainda, e em que grau, as mesmas belas virtudes se acham em nossa alma, visto que nos foram infusas pelo Sacramento do Batismo.
I. Considera o belo elogio com que o Espírito Santo presta na Sagrada Escritura homenagem às virtudes do Protomártir Santo Estêvão. Chama-o em primeiro lugar de cheio de fé: Elegeram Estêvão, homem cheio de fé – Elegerunt Stephanum virum plenum fide (1). Ser cheio de fé, segundo Santo Tomás (2), quer dizer, não somente ter uma firmeza eminente em crer todas as verdades reveladas, junto com um amor ardente à revelação e uma conformidade perfeita com a vontade de Deus que revela; mas quer dizer além disso, possuir o depósito inteiro da fé conhecimento explícito de todas as suas partes. Por esta razão São Jerônimo diz que Santo Estêvão era doutíssimo na lei.
O Espírito Santo chama Santo Estêvão em segundo lugar cheio de graça e de fortaleza: plenus gratia et fortitudine (3), porque advogava a causa de Jesus Cristo ao mesmo tempo com doçura e com zelo ardentíssimo. Temos a prova naquele sublime discurso que fez antes de morrer. Depois de pedir ao povo e aos anciãos que o escutassem em quanto lhes pregasse a salvação, Santo Estêvão expôs-lhes em seguida todos os favores que tinham recebido de Deus e a negra ingratidão com que lhe haviam pago. Vendo, porém, que com bons modos não conseguia abrandar-lhes o coração, começou a deitar-lhes à cara os seus defeitos, e com coragem heroica concluiu dizendo que eram homens duros de cerviz, e de corações e ouvidos incircuncisos, que sempre resistiam ao Espírito Santo (4).
Afinal a Sagrada Escritura chama Santo Estêvão cheio de todos os carismas celestiais: Cum autem esset plenus Spiritu Santo (5). Por isso se diz que fazia grandes prodígios e milagres entre o povo (6); que não se podia resistir a sua sabedoria (7); que o seu rosto era refulgente como o de um anjo (8); e que pouco antes de expirar teve a ventura de ver os céus abertos, a glória de Deus, e Jesus à direita de Deus (9). Alegra-te com o santo Diácono e dá graças a Deus por havê-lo enriquecido com tantas virtudes. Volvendo em seguida os olhos à tua própria alma, vê se em ti se acham as mesmas virtudes e o modo como as praticas, visto que te foram infusas no Sacramento do Batismo.
II. Muito embora Santo Estêvão se avantajasse em todas as virtudes, distinguiu-se todavia particularmente pelo amor de Deus e do próximo. Deu prova de seu amor de Deus sofrendo, o primeiro entre os fiéis, um doloroso martírio pela pregação da fé. Portanto os judeus, “ouvindo as suas repreensões e ameaças, se exasperaram em seus corações, e rangeram os dentes contra ele. E levantando um grande clamor, taparam os seus ouvidos, e todos juntos arremeteram contra ele, e expelindo-o para fora da cidade, o apedrejaram”(10).
Mostrou igualmente o seu amor para com o próximo. Desprezando a desmembração de seu próprio corpo e lamentando unicamente a obcecação dos seus algozes, opôs benefícios à injúria, amor ao ódio, doçura à ira, bondade à malquerença (inimizade). Com uma palavra, o Santo pôs em prática o ensino do divino Mestre: Rogai pelos que vos perseguem (11); por isso, “pondo-se de joelhos, clamou em alta voz, dizendo: Senhor, não lhes imputeis este pecado. E tendo disto isto, dormiu no Senhor”(12). Esta caridade heroica agradou de tal forma a Jesus Cristo, que, na opinião de Santo Agostinho, mereceu a conversão do Apóstolo São Paulo, que “dera consentimento à morte de Estêvão”.
Que lição para ti, se a souberes aproveitar! Examina o teu coração para ver se nutre sentimentos de aversão ou de antipatia contra o próximo, e roga ao Senhor, te dê força para perdoar de boa vontade todas as injúrias, ainda que imerecidas, para suportares os defeitos dos outros, assim como estes suportam os teus, e para te mostrares sempre amável para com todos, sem nenhuma exceção.
“Concedei-nos, Senhor, a graça de imitar o que veneramos neste dia, para que, celebrando o natalício daquele que soube rogar pelos seus perseguidores, aprendamos a amar os nossos inimigos (13)”. Fazei-o pelo amor do mesmo Jesus Cristo e da nossa amada Mãe Maria.
Referências: (1) At 6, 5 (2) Suma Teológica 2 2, q. 6, a. 4 (3) At 6, 8 (4) At 7, 51 (5) At 7, 55 (6) At 6, 8 (7) At 6, 10 (8) At 6, 15 (9) At 7, 55 (10) At 7, 54-57 (11) Mt 5, 44 (12) At 7, 59 (13) Or. fest. curr.
(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 81-84)
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