O Coração de Jesus, modelo de Fidelidade
Fidelis est, qui vocavit vos; qui etiam faciet — “Fiel é o que vos chamou; o qual também o fará” (1 Ts 5, 24)
Sumário. Jesus tem um Coração tão fiel, que, quando é abandonado, traído, desprezado por uma criatura infiel, vai à sua procura, instando com ela para que torne à sua amizade. Estimulado por amor extremo, faz todos os esforços para reconquistar a alma que o deixou, a fim de que ela se digne ao menos responder a um Coração que nunca lhe faltou na fidelidade.
I. O Coração de Jesus é fiel a cada alma que se lhe quer dar (1). Mas, ai! Muitas vezes acontece que a alma cai na infidelidade e abandona a Jesus Cristo. O Coração de Jesus, porém, é tão fiel que, quando é abandonado, traído, desprezado por uma criatura infiel, vai à sua procura; estimulado por amor extremo faz todos os esforços para reconquistar a alma que o deixou; pede, exorta, convida, promete, ora, suplica, a fim de que ela se digne ao menos responder a um Coração que nunca lhe faltou com a fidelidade.
E de que maneira, ó meu Jesus, recebereis a alma infiel? Ela me será, diz Deus pelo profeta Jeremias, tão cara como antes.
“Volta, ó alma rebelde, e não farei cair a minha ira sobre ti; porque benigno sou, e não conservarei para sempre a minha ira” (2)
Tal é a linguagem cheia de ternura para com toda a alma que lhe foi infiel. Que bondade! Que caridade! Almas há que receberam de Jesus favores singulares e o deixam por uma miserável paixão. Almas há que deveriam experimentar a mais pungente dor por não ver o Coração de Jesus amado por todos os homens, e conservam o seu coração apegado às criaturas.
Uma das causas desta infidelidade é a falta de oração, que faz com que Deus nos retire o seu socorro; e sem o socorro de Deus não podemos observar os seus mandamentos, nem viver segundo os seus conselhos. Donde vem, diz o sábio bispo Abelly, a relaxação que se nota nos costumes, senão da falta de oração? Outra causa é o amor do mundo, que dificilmente se concilia com a fidelidade a Deus. Todos os que vivem para o mundo, diz Santo Ambrósio, estão sob o poder tirânico do pecado. O ar do mundo é nocivo à alma: aquele que o respira, contrai facilmente alguma enfermidade espiritual.
II. A terceira causa das infidelidades da alma são as paixões, os nossos mais terríveis inimigos. Há pessoas que praticam muitas devoções, comunhões, devoções, jejuns e penitências, mas desprezam vencer as suas paixões, certos ressentimentos, certas curiosidades, certas afeições perigosas; não sabem suportar as contrariedades, submeter a sua vontade à obediência. Estas pessoas não somente não atingirão a perfeição, mas, continuando a seguir as suas paixões, vão de mal a pior e tornar-se-ão infiéis a Deus. “A menor faísca, que não se extingue”, diz São Tiago, “pode fazer arder toda uma floresta; e uma paixão não reprimida pode conduzir a alma à sua perdição” (3).
Ó meu Jesus, se todos os homens parassem para Vos considerar na cruz com fé viva, crendo que sois o seu Deus, e morrestes para salvá-los, como poderiam viver separados de Vós e privados do vosso amor? E eu, sabendo bem tudo isto, como tenho podido dar-vos tantos desgostos? Se os outros Vos ofenderam, ao menos pecaram nas trevas, ao passo que eu Vos ofendi em plena luz. Mas estas mãos traspassadas, este lado aberto, este sangue, estas chagas, que eu considero em Vós, fazem-me esperar o perdão e a vossa graça.
Ó meu amor, aflito estou por Vos ter desprezado; agora Vos amo de todo o meu coração e nada me contrista mais que a lembrança de Vos ter ofendido; possa a dor que sinto, ser sinal de que me haveis perdoado! Ó Coração ardente de Jesus, abrasai o meu pobre Coração! Ó meu Jesus, morto pelas dores que Vos causei, fazei com que eu morra pela dor de Vos ter ofendido, e pelo amor que de mim mereceis. Eu me sacrifico todo por Vós, que Vos sacrificastes todo por mim. Ó Maria, Virgem fiel, fazei com que até a minha morte eu seja fiel ao amor de meu e vosso Jesus.
Referências: (1) Estas meditações foram tiradas do livro “Devoção ao Sagrado Coração de Jesus segundo Santo Afonso Maria de Ligório” pelo Pe. Saint-Omer, C. Ss. R. (2) Jr 3, 12. (3) Tg 3, 5.
(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo III: Desde a Duodécima semana depois de Pentecostes até ao fim do ano Eclesiástico. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 407-410)
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