Meditação de 25 de outubro

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Solidão de Jesus na Gruta de Belém

Solidão de Jesus na Gruta de Belém

Ecce elongavi fugiens; et mansi in solitudine — “Eis que me alonguei fugindo, e permaneci na soledade” (Sl 54, 8)

Sumário. A fim de nos sugerir o amor à solidão e ao silêncio, quis Jesus nascer fora da cidade e numa gruta solitária. Felizes de nós se, à imitação de José e Maria, nos entretivermos com ele nessa santa solidão. Aí o divino Menino nos falará, não ao ouvido, mas ao coração. Vendo a sua pobreza, ouvindo os seus vagidos, considerando que um Deus se reduziu a tal estado pelo nosso amor, ser-nos-emos atraídos suavemente a ele, e não poderemos deixar de o amar de todo o nosso coração, copiando em nós as suas virtudes.

I. Nascendo Jesus, quis escolher para sua ermida e oratório a gruta de Belém, pelo que dispôs que nascesse fora da cidade, numa solitária espelunca, a fim de nos sugerir o amor à solidão e ao silêncio. Jesus, na sua manjedoura, conserva-se silencioso; silenciosos Maria e José o adoram e contemplam. Foi revelado a Sóror Margarida do Santíssimo Sacramento, chamada a esposa de Jesus Menino, que tudo o que se deu na gruta de Belém, mesmo a visita dos pastores e a adoração dos santos Magos, foi tudo feito em silêncio.

O silêncio das demais crianças provém da sua impotência, mas em Jesus Cristo foi virtude. Jesus Menino não fala, mas quanto nos diz o seu silêncio! Feliz daquele que na santa solidão do presépio se entretém com Jesus, Maria e José! Por pouco que os pastores ali se tenham demorado, voltaram todos abrasados no amor divino, pois que não cessavam de o louvar e bendizer: Reversi sunt laudantes et glorificantes Deum (1). Ó feliz da alma que se encerra na solidão de Belém para contemplar a misericórdia divina e o amor que Deus teve e ainda tem aos homens.

Ducam eam in solitudinem et loquar ad cor eius (2) — “Eu a levarei à solidão e lhe falarei ao coração”

Na sua solidão o divino Menino nos falará, não ao ouvido, mas ao coração, convidando-nos ao amor de um Deus que tanto nos ama. Contemplando ali a pobreza daquele lindo ermitãozinho, que está numa fria espelunca, sem lume, com uma manjedoura por berço e um pouco de palha por colchão; ouvindo os vagidos, e vendo as lágrimas daquele Menino inocente; considerando, enfim, que ele é o nosso Deus, como poderemos pensar em outra coisa que não seja amá-lo? Ah! Que doce ermida é para uma alma de fé a gruta de Belém, na qual o Senhor nos fala e conversa conosco, não como rei, mas como amigo, irmão e esposo! Ó! Que paraíso é o conversar a sós com Jesus Menino na lapinha de Belém!

II. Imitemos Maria e José, que, abrasados em amor, se detêm na contemplação do grande Filho de Deus, feito homem e sujeito às misérias terrestres. Contemplam a sabedoria feita criança sem fala; o grande feito pequenino; o supremo tão humilhado; o rico feito tão pobre, o todo-poderoso feito fraco. Numa palavra, considerando a majestade divina oculta sob a forma de uma criança pequenina, desprezada e abandonada do mundo, fazendo e padecendo tudo para se tornar amável aos homens, roguemos-lhe que nos admita ao seu santo retiro. Paremos ali e nunca mais dali nos afastemos. Querido Salvador meu, Vós sois o Rei do céu, o Rei dos reis, o Filho de Deus; como estais pois nessa gruta, abandonado por todos? Para Vos assistir não vejo senão José e vossa santa Mãe. Desejo ajuntar-me a eles para Vos fazer companhia. Não me recuseis. Não sou digno disso, mas sinto que me convidais com os vossos doces convites interiores. Sim, a Vós venho, ó amadíssimo Menino; deixo tudo para ficar só convosco, durante toda a minha vida, ó meu querido Solitário, único amor da minha alma.

Que insensato que sou! No passado Vos abandonei e Vos deixei só, meu Jesus, e fui mendigar junto das criaturas prazeres miseráveis e venenosos; mas agora, iluminado pela vossa graça, não desejo senão viver só convosco, que quereis viver solitário nesta terra. Quis dabit mihi pennas sicut columbae? Volabo et requiescam (3) — “Quem me dará asas como da pomba? Voarei e descansarei”.

Ah! Quem me dera poder fugir deste mundo, onde tantas vezes achei a minha ruína; fugir dele e ficar sempre convosco, que sois a alegria do paraíso e amigo verdadeiro da minha alma. Senhor, prendei-me aos vossos pés, a fim de que me não aparte mais de Vós, e goze a felicidade de Vos fazer contínua companhia. Ah! Pelos merecimentos da vossa solidão na gruta de Belém, concedei-me recolhimento contínuo; de tal forma que a minha alma se torne uma cela solitária, na qual a minha única ocupação seja entreter-me convosco, submeter-Vos todas as minhas ações e pensamentos, consagrar-Vos todos os meus afetos, amar-Vos sempre e suspirar sem cessar por sair da prisão do meu corpo, para Vos ir amar sem véu no paraíso. Amo-Vos, ó bondade infinita, e espero amar-Vos sempre, no tempo e na eternidade. Ó Maria, ó vós que podeis tudo, pedi a Jesus me prenda com os laços do seu amor e não permita me suceda perder novamente a sua graça.

Referências: (1) Lc 2, 20. (2) Os 2, 14. (3) Sl 54, 7.

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo III: Desde a Duodécima semana depois de Pentecostes até ao fim do ano Eclesiástico. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 416-418)

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Sexta palavra de Jesus Cristo na Cruz

Sexta palavra de Jesus Cristo na Cruz

Cum ergo accepisset Jesus acetum, dixit: Consummatum est – “Jesus, havendo tomado o vinagre, disse: Tudo está consumado” (Jo 9, 30)

Sumário. Consideremos como Jesus moribundo, antes de expirar, percorreu em espírito toda a sua vida. Viu todos os seus trabalhos penosos, as suas dores, as ignomínias suportadas e tudo isso ofereceu-o de novo a seu eterno Pai para a salvação do mundo. Em seguida, virando-se para nós, disse: Tudo está consumado. — Foi como se dissesse: “Ó homens, nada mais tenho a fazer para ser amado por vós; tempo é que afinal resolvais amar-me.” Amemos, portanto, a Jesus e provemos-Lhe nosso amor fazendo e sofrendo alguma coisa por seu amor, assim como Ele fez e sofreu tanto por nosso amor.

I. Nosso amabilíssimo Jesus, chegado o momento de render o último suspiro, disse com voz moribunda: Tudo está consumado. Pronunciando estas palavras, repassou em seu pensamento todo o decurso de sua vida, viu todos os seus trabalhos, a pobreza, as dores, as ignomínias que tinha sofrido e tudo ofereceu de novo a seu Pai pela salvação do mundo. Depois, voltando-se para nós disse: Tudo está consumado. — Foi como se dissesse: Homens, tudo está consumado, tudo está cumprido; a ora da vossa redenção se completou, a divina justiça está satisfeita, o paraíso está aberto. Et ecce tempus tuum, tempus amantium (1) — “Eis aqui o vosso tempo, o tempo dos que amam”. É tempo, enfim, ó homens, de vos resolverdes a amar-me. Amai-me, pois, amai-me; porque nada mais tenho a fazer para ser amado por vós.

Tudo está consumado. Vede, disse então Jesus moribundo, vede o que tenho feito para adquirir o vosso amor. Por Vós tenho levado uma vida cheia de tribulações; no fim de meus dias, antes de morrer, consenti que fosse derramado o meu sangue, que me escarrassem no rosto, que me despedaçassem o corpo, que me coroassem de espinhos; finalmente, sujeitei-me a suportar as dores da agonia sobre este madeiro em que me vedes. Que resta fazer? Uma só coisa: expirar por vós. Sim, quero morrer. Vem, ó morte, eu to permito, tira-me a vida pela salvação de minhas ovelhas, amai-me, amai-me, porque já não posso ir mais longe para me fazer amar. Consummatum est — “Tudo está consumado”.

Amemos, pois, a nosso Jesus, e, conforme à exortação do Apóstolo, provemos-Lhe nosso amor, correndo com paciência generosa ao combate que em vida teremos de sustentar conta os nossos inimigos espirituais; provemos-lho resistindo até ao fim as tentações, a exemplo de Jesus Cristo mesmo, que não desceu da cruz antes de expiar e quis consumar o seu sacrifício até morrer: Per patientiam curramus ad propositum nobis certamen, aspicientes in auctorem fidei et consummatorem Iesum (2) — “Corramos pela paciência ao combate que nos é proposto, olhando para o autor e consumador da fé, Jesus”.

II. Quando as paixões interiores, as tentações do demônio, ou as perseguições da parte dos bons, nos fizerem perder a paciência e aceitar a ofensa de Deus, olhemos para Jesus crucificado que derramou todo o seu sangue pela nossa salvação e lembremo-nos que por seu amor não temos ainda derramado uma só gota de sangue: Nondum enim usque ad sanguinem restitistis, adversus peccatum repugnantes (3) — “Ainda não resististes até o sangue, combatendo contra o pecado”.

Quando tivermos de ceder em algum pundonor, de reprimir algum ressentimento, de nos privarmos de alguma satisfação, de alguma curiosidade ou de outra coisa inútil à nossa alma, tenhamos pejo de o recusarmos a Jesus Cristo. Jesus se nos deu sem reserva, deu-nos toda a sua vida, todo o seu sangue: tenhamos, pois, pejo de usarmos de reserva para com Ele. Não nos enfastiemos de fazer e sofrer alguma coisa por amor de Jesus Cristo, que por nossa salvação chegou, no dizer de Taulero, “a consumar tudo o que a justiça divina exigia, tudo o que o amor pedia, tudo o que podia dar um claro testemunho de seu amor”.

Meu amabilíssimo Jesus, tomara que eu também pudesse dizer morrendo: Senhor, tudo está consumado; tenho feito tudo que me mandastes, tenho levado com paciência a minha cruz, tenho procurado agradar-Vos em tudo. Ah, meu Deus! Se tivesse de morrer agora, morreria bem descontente de mim mesmo, pois nada disto poderia dizer. Mas, Senhor, viverei sempre tão ingrato ao vosso amor? Suplico-Vos que me concedais a graça de Vos agradar nos anos de vida que me restam, a fim de que, quando vier a morte, possa dizer-Vos que ao menos desde o dia de hoje cumpri a vossa vontade. — Se no passado Vos ofendi, a vossa morte é a minha esperança; para o futuro não Vos quero trair mais. De Vós espero a minha perseverança; eu a peço e o espero, ó meu Jesus, pelos vossos merecimentos. — Ó Maria, Mãe das dores, ajudai-me pela vossa intercessão.

Referências:

(1) Ez 6, 8 (2) Hb 12, 1 (3) Hb 12, 4

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo III: Desde a Décima Segunda Semana depois de Pentecostes até o fim do ano eclesiástico. Friburgo: Herder & Cia, 1922, p. 220-223)

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