Meditação de 27 de dezembro

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Oferecimento do coração a Jesus Menino

Oferecimento do coração a Jesus Menino

Dilectus meus mihi et ego illi, qui pascitur inter lilia. — “O meu amado é meu e eu sou dele, que se apascenta entre as açucenas” (Cant. 2, 16).

I. Alma devota, aviva a tua fé e a tua confiança. O mesmo Jesus que, por nosso amor, baixou do céu à terra e quis nascer numa gruta fria, está agora, abrasado no mesmo amor, escondido no Santíssimo Sacramento. Que é o que faz ali? Respiciens per cancellos (1) — “Olha por entre as grades”. Qual amante aflito pelo desejo de ver seu amor correspondido, Jesus de dentro da Hóstia consagrada, como que por entre uma grade estreita, olha-te sem ser visto, espreita os teus pensamentos, os teus afetos, os teus desejos, e convida-te suavemente achegar-te a si. Eia pois, dá contento ao Amante divino e aproxima-te d’Ele.

Lembra-te, porém, do que ordena: Non apparebis in conspectu meo vacuus (2) — “Não aparecerás em minha Presença com as mãos vazias”. Quem se chegar ao altar para me honrar, não se chegue sem me presentar alguma oferta. Na noite do Natal, os pastores que foram visitar o Menino Jesus na gruta de Belém, trouxeram-lhe os seus presentes. É pois mister que tu também Lhe ofereças o teu presente. Que poderás oferecer-lhe? O presente mais precioso, que possas trazer para o Menino Jesus, é um coração penitente e amante: Praebe, fili mi, cor tuum mihi (3) — “Meu Filho, dá-me o teu coração”.

Ó meu Senhor, eu não devia ter ânimo de me chegar a Vós, vendo-me tão manchado de pecados. Mas já que Vós, Jesus meu, me convidais com tamanha benevolência e me chamais com tamanho amor, não quero resistir. Não quero fazer-Vos esta nova afronta que, depois de Vos ter tantas vezes virado as costas, deixasse agora por desconfiança de aceder a vosso doce convite. Mas sabeis que sou pobre de tudo e que não tenho nada que oferecer-Vos. Não tenho senão o meu coração, e este Vô-lo dou. Verdade é que este meu coração durante algum tempo Vos tem ofendido, mas agora está arrependido, e contrito como se acha, eu Vô-lo ofereço. Sim, meu divino Menino, pesa-me de Vos ter dado desgosto. Confesso-o: tenho sido um traidor, um ingrato, um desumano fazendo-Vos sofrer tanto e derramar tantas lágrimas no presépio de Belém; mas as vossas lágrimas são a minha esperança. Sou um pecador e não mereço perdão, mas dirijo-me a Vós, que, sendo Deus, Vos fizestes criança para me perdoar. — Pai Eterno, se eu mereci o inferno, vede as lágrimas desse vosso Filho inocente; são elas que Vos imploram o meu perdão. Vós não negais nada às súplicas de Jesus Cristo. Atendei-O, visto que Vos pede que me perdoeis nestes dias santíssimos, que são dias de alegria, dias de salvação, dias de perdão.

II. Ó meu pequenino Jesus, espero que me perdoareis; mas só o perdão de meus pecados não basta. Neste santo tempo do Natal dispensais às almas graças grandes. Eu também quero uma graça bem grande, e deveis conceder-ma: é a graça de Vos amar. Agora que me chego aos vossos pés, abrasai-me todo em vosso amor e prendei-me a Vós, mas prendei-me de tal modo que eu nunca mais me afaste de Vós. Assim, ó meu Deus amabilíssimo, espero que Vos amarei sempre e que Vós sempre me amareis: assim, ó meu amado Jesus, espero que serei sempre todo vosso e que Vós sempre sereis todo meu: Dilectus meus mihi et ego illi — “O meu amado é para mim e eu sou para ele.” Creio em Vos, ó Bondade infinita; espero em Vós, ó Bondade infinita; amo-Vos, ó Bondade infinita. Amo-Vos, ó meu Deus, feito Menino por meu amor, amo-Vos, e sempre o hei de repetir, amo-Vos, amo-Vos. † Jesus, meu Deus, amo-Vos sobre todas as coisas (4).

Mas, não Vos amo bastante; quero amar-Vos muito, e Vós deveis fazer que assim seja. Ofereço-Vos o meu coração, entrego-o todo inteiro, não o quero mais. Mudai-o e guardai-o para sempre. Não mo entregueis mais, pois, se o entregardes em minhas mãos, tenho medo que Vos tornará a trair.

Maria Santíssima, vós sois a Mãe desse grande Filho, sede também minha Mãe; em vossas mãos deposito o meu coração, apresentai-o a Jesus; se Lho apresentardes, Jesus não o rejeitará. Apresentai-o, pois, e rogai que o queira aceitar. Amém.

Referências: (1) Ct 2, 9 (2) Ex 23, 15 (3) Pv 23, 26 (4) 50 dias de indulg. para quem rezar esta jaculatória ou a ensinar aos outros.

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 89-91)

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Festa de São João Evangelista

Festa de São João Evangelista

Discipulus ille quem diligebat Iesus — “O discípulo a quem Jesus amava” (Io. 21, 7).

Sumário. Consideremos as provas de predileção especial que Jesus deu a seu discípulo João. Chamou-o um dos primeiros, ao apostolado; fê-lo seu confidente, na última ceia permitiu-lhe que reclinasse a cabeça sobre o seu peito; finalmente, no Calvário fê-lo herdeiro do que tinha de mais caro, dando-lhe como mãe a Maria. Nós também temos recebido de Deus muitas provas de predileção; mas que diferença entre a nossa correspondência e a de São João!

I. Considera as provas de predileção que Jesus deu a São João. Chamou-o um dos primeiros, ao apostolado; e ainda que fosse o mais jovem de todos, Jesus lhe comunicou os arcanos mais recônditos do seu coração, fê-lo seu confidente, de sorte que o Príncipe dos Apóstolos, não se animando a interrogar o Senhor na última ceia, rogou a João que o fizesse. Junto com São Tiago, seu irmão, e São Pedro, Jesus o fez testemunha do milagre da ressurreição da filha de Jairo, da sua gloriosa Transfiguração no Tabor e de sua agonia no horto. Também na última ceia, quando Jesus quis fazer os supremos esforços de seu amor, e deu a todos, pela instituição da santíssima Eucaristia, um penhor especial do seu afeto, deu todavia um penhor especialíssimo para o seu amado João. Fê-lo sentar-se a seu lado e permitiu-lhe reclinasse a cabeça sobre o seu peito. Desse contato, diz Santo Agostinho, João tirou os sublimes conhecimentos de mistérios incompreensíveis, que depois registrou no seu Evangelho e que lhe alcançaram o nome de teólogo divino por excelência, e de águia entre os evangelistas.

Mas a mostra mais patente de afeto deu Jesus Cristo a este seu Benjamin no Monte Calvário, quando, prestes a expirar, lhe deu Maria por mãe, instituiu-o herdeiro do que havia mais caro, e declarou-o primogênito entre os filhos adotivos da Mãe de Deus. — Detém-te aqui para te alegrar com o Santo; escolhe-o para teu protetor especial, e dá graças a Jesus Cristo por lhe haver concedido tantos favores singulares. Mas ao mesmo tempo dá-lhe graças pelos mesmos benefícios que te fez, chamando-te ao seu seguimento, vindo dentro de teu peito na santa Comunhão e dando-te Maria Santíssima por teu refúgio, tua advogada e tua mãe.

II. Se São João foi tão amado de Jesus Cristo, é forçoso dizermos que São João amou também muito a Jesus, porque Jesus assegura-nos que ama os que o amam — ego diligentes me diligo (1). Com efeito, toda a vida do Apóstolo foi um modelo luminoso de amor. Apenas chamado na margem do lago Genezaré, deixou as redes, seu pai e sua mãe e foi em seguimento do Redentor. Chegando a saber que a pureza virginal faz as delicias de Jesus, que é amigo das virgens e se apascenta entre as açucenas (2), resolveu guardá-la sempre em sua pessoa. — Durante a vida do divino Redentor, o amor fez com que São João continuamente contemplasse as amabilidades infinitas de Jesus, e se esmerasse em agradar-Lhe mais e mais, por meio de atos internos e externos das virtudes mais sublimes. — No tempo da Paixão o amor o fez avantajar-se aos outros apóstolos, impeliu-o a seguir o Senhor até ao Calvário, e a deixar-se ficar intrépido ao pé da Cruz, a fim de lhe trazer, se não defesa, ao menos alívio.

Finalmente, depois da Ascensão de Jesus, o amor estimulou São João a pregar a fé não só na Judéia e na Samaria, mas também em várias partes da Ásia. E como se não lhe bastasse a pregação de viva voz, quis ainda escrever o seu Evangelho, as suas Epistolas e o livro do Apocalipse, livros estes que respiram caridade e amor em todas as páginas. Ademais, quis expor-se generosamente ao martírio, ainda que o Senhor o livrasse, guardando-o para coisas maiores. Pôde São João responder melhor à predileção da parte de Jesus Cristo?… Que confusão para ti! Depois de teres recebido tantas mostras de afeto especial do Senhor, em vez de amá-Lo, respondeste-Lhe com ingratidões e pecados. Roga a Deus, que te perdoe pela intercessão do santo Apóstolo.

“Ó Senhor, ilustrai benignamente a vossa Igreja para que, instruída com as doutrinas do Bem-aventurado João, vosso Apóstolo e Evangelista, alcance os dons sempiternos.” (3) Fazei-o pelo amor de Jesus Cristo e de Maria Santíssima.

Referências: (1) Pv 8, 17 (2) Ct 2, 16 (3) Or. festi.

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 86-89)

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