Santo Anselmo, Bispo de Canterbury, O.S.B.
(† 1109)
Anselmo, filho de Gondulfo e Ermengardes, ambos de nobre estirpe lombarda, o grande arcebispo de Candelburgo ou Canterbury nasceu em Aosta no Piemonte, em 1033. A piedosa mãe soube implantar no coração do filhinho um amor profundo à virtude, e Anselmo jamais se esqueceu dos sábios conselhos. Privilegiado de talento primoroso, fez Anselmo belos progressos nos estudos. Não tendo ainda 15 anos de idade, manifestou desejos de dedicar-se à carreira eclesiástica e neste intuito procurou um abade, o qual porém, prevendo o protesto do pai, lhe negou a admissão. Anselmo entristeceu-se muito com este insucesso e adoeceu gravemente. Na doença renovou o propósito de filiar-se a uma Ordem religiosa. Restabelecido da moléstia, Anselmo não mais se lembrou do que se propusera; pelo contrário, mudou de ideias de tal maneira, que, em vez de servir a Deus, procurou o bem estar nos divertimentos e prazeres mundanos. Por infelicidade perdeu o amor do pai, que começou a tratá-lo com aspereza. Anselmo, não querendo sujeitar-se às arbitrariedades e injustiças do progenitor, ausentou-se do país e passou três anos na Borgonha julgando que, com a ausência, as coisas melhorariam.
De fato melhoraram, voltando ao jovem o antigo amor ao estudo. Tendo-lhe chegado ao conhecimento que o célebre mestre, seu compatrício Lanfranc, se dedicava ao magistério no convento de Bec, a ele se dirigiu pedindo admissão entre seus discípulos. Sob a direção de Lanfranc, fez progressos tais, que em poucos meses se distinguiu entre todos os condiscípulos.
Voltou também ao coração de Anselmo o amor à virtude e à oração. Tomou novo vulto a antiga resolução de ser sacerdote. Desta vez a pôs em execução. Na idade de 27 anos, tomou o hábito de S. Bento. A mudança de vida foi tal, que, passado o tempo de noviciado e mais três anos de professo, foi eleito sucessor do mestre Lanfranc, no cargo de Prior. Houve quem, com inveja e malquerença observasse o progresso do jovem religioso, mas Anselmo, com paciência, delicadeza, amor e justiça, soube desarmar todos os desafetos.
O dia passava, instruindo os discípulos nas ciências profanas e divinas, para dedicar à oração as horas silenciosas da noite. Aos doentes dispensava um cuidado particular. Não só os visitava frequentes vezes, mas com as próprias mãos lhes prestava os serviços que o seu estado exigia.
Profundo e constante era o seu amor à Sagrada Paixão e Morte de Jesus Cristo. Copiosas e amargas lágrimas derramava, chorando os desvarios da mocidade. Deus deu-lhe um horror tal ao pecado, que preferia precipitar-se no inferno, a ofender a Deus. Do pecado, por menor que fosse, fugia com todo escrúpulo, porque, vendo nele uma ofensa a Deus o considerava um grande mal, capaz de prejudicar os interesses da alma.
Grande devoção tinha à Santíssima Virgem Maria. Entre os grandes escritores da Igreja, figura Anselmo entre os primeiros que ensinaram e defenderam a Imaculada Conceição. Muitas obras escreveu em honra da excelsa Rainha do céu, da Bem-aventurada Mãe de Deus.
Em atenção a sua grande atividade e ao seu talento como escritor e mestre, deu-se-lhe o título de "precursor" ou "pai da escolástica".
Quando morreu o abade Herluino, em 1073, a comunidade de Bec elegeu a Anselmo seu sucessor. Nesta nova dignidade, nada modificou o seu modo de vida, a não ser de ainda mais se dedicar aos exercícios da vida interior.
Negócios do Convento reclamavam-lhe muitas vezes a presença na Inglaterra. Serviu-lhe esta circunstância para estreitar cada vez mais os laços de amizade, que o ligavam a Lanfranc, que tinha sido eleito Arcebispo de Canterbury. A fama de santidade e ciência de Anselmo tinha já passado as fronteiras da França. O abade de Bec gozava de geral simpatia, entre os príncipes seculares e eclesiásticos. O próprio Papa Gregório VII, por diversas vezes, se recomendou às orações de Anselmo. Guilherme, o Conquistador, temido e odiado pelos ingleses e homem que a poucos se dignava de dizer uma palavra, achava o maior agrado em poder conversar com o santo Abade. Da grande influência, que possuía, Anselmo se serviu para o bem do reino de Deus e a salvação das almas. A prudência e a extraordinária amabilidade fizeram com que os mais rebeldes lhe abrissem o coração.
Tinha morrido o grande amigo de Anselmo, o Arcebispo de Canterbury. Para poder apoderar-se dos riquíssimos rendimentos do arcebispado, o rei se opôs à eleição de um sucessor de Lanfranc. Deus mandou-lhe uma doença gravíssima que fez modificar o pensar do monarca. Roído de remorsos, nomeou a Anselmo arcebispo, no que deste mesmo achou a maior resistência.
"Queres desgraçar-me na eternidade?" Perguntou-lhe o rei. "A salvação de minha alma está em tuas mãos. Não dando eu um bispo a Canterbury, receio não merecer a graça de Deus". Os bispos e grandes do reino apoiaram a opinião do rei e insistiram com Anselmo, para que não opusesse resistência: "Tua oposição — disseram-lhe eles — serve-nos de escândalo, e se persistires na tua resolução, responderás diante de Deus por todos os males, que sobrevierem". Anselmo, porém, persistiu na recusa. Só depois da formal declaração do rei, de reconhecer a legitimidade de Gregório VII, como Papa, e da promessa de fazer restituição dos bens, ilegalmente tirados à arquidiocese de Canterbury, aceitou a dignidade, que lhe fora oferecida.
Mal tinha o rei recuperado a saúde, esqueceu-se dos bons propósitos. No intuito de conquistar a Normândia, exigiu dos súditos novos impostos. Anselmo deu-lhe duzentas libras de prata, soma avultadíssima naqueles tempos. Quando, porém, o rei exigiu a contribuição de outras duzentas libras, respondeu-lhe Anselmo, que não era lícito dispor dos bens da Igreja, por serem bens dos pobres.
Outros abusos e irregularidades que existiam e que uma reforma reclamavam, Anselmo recomendou-as ao rei, com a maior insistência. Em vão. Diversas abadias continuavam sem abade, aos bispos era negado o direito de se reunirem em conferências, para tratarem dos interesses das dioceses. O rei começou a enxergar em Anselmo, um conselheiro importuno, um empecilho incômodo na execução dos seus planos. O mesmo, que tanto se empenhara em elevá-lo à dignidade de arcebispo, pôs agora em ação todos os recursos para fazê-lo renunciar. Para este fim, organizou uma propaganda tenaz, entre o clero superior e os Grandes do Reino, contra Anselmo, e não trepidou em ganhar o Sumo Pontífice para essa causa.
Nada porém conseguiu. Teve o desgosto de ver fracassarem os seus planos um por um. Restava-lhe só recorrer à força, e por este meio se apoderou dos bens da arquidiocese de Canterbury. Deixando seu protesto nas mãos do rei, Anselmo afastou-se da Inglaterra, apresentou-se ao Papa Urbano II o qual lhe tomou a defesa contra o procedimento ilegal e arbitrário de Guilherme, sem, porém, conseguir que este abandonasse a política injusta. Urbano, vendo a contumácia do monarca, teria lançado a excomunhão contra ele se Anselmo não tivesse insistido, com empenhadas súplicas, que tal pena não fosse aplicada. Pouco tempo depois, recebeu a notícia da morte subitânea do rei.
O sucessor de Guilherme II, Henrique I, parecia ser animado de ideias mais conciliadoras. Um dos seus primeiros atos foi convidar Anselmo para que voltasse para a Inglaterra. O retorno do Santo à sua diocese revestiu-se do maior brilho, e a audiência que teve com o monarca, correu na maior cordialidade. Tudo fazia crer, que a paz estava restabelecida. Os fatos, porém, não justificaram esta doce esperança. Henrique consentiu que Anselmo retomasse o governo da arquidiocese de Canterbury com a condição, porém, do arcebispo aceitar o poder das mãos do monarca, e prestar-lhe o juramento de vassalagem. Anselmo, baseando-se na decisão do último concílio, celebrado em Roma, que condenou o abuso da investidura, se opôs a esta exigência do rei. Henrique negou-se a reconhecer a competência desse Concílio, e apelou para o Papa.
Estavam as coisas neste pé, quando no horizonte político surgiu ameaçadora uma nova tempestade. Roberto, duque de Normandia, irmão de Henrique, achando-se de volta de uma campanha na Palestina, queixou-se amargamente da injustiça que lhe fora feita, de o terem pretendido, na sucessão do trono da Inglaterra. Não satisfeito com as razões justificativas, resolveu fazer valer seus direitos à coroa, e declarou guerra ao irmão. A situação tornou-se assaz crítica para Henrique, visto que elevado número dos Grandes tomou o partido de Roberto. Neste grande embaraço, pediu a intervenção de Anselmo, prometendo-lhe, nunca mais se imiscuir em negócios eclesiásticos. Devido à grande autoridade e ao extraordinário prestígio do arcebispo, os Grandes desistiram da política e resolveram guardar fidelidade a Henrique. Bem depressa se esqueceu este das promessas, e a luta pela investidura recomeçou. Anselmo se dirigiu novamente a Roma, onde encontrou todo o apoio. Proibido de voltar para a Inglaterra, ficou Anselmo na França, onde achou fraternal acolhimento da parte do arcebispo de Lion.
A luta da investidura terminou em 1106. Achou-se uma fórmula, satisfatória para ambas as partes. Anselmo pôde voltar para a arquidiocese, onde foi recebido com grandes manifestações de alegria geral. Poucos anos pôde Anselmo gozar em paz. O peso dos anos já se fazia sentir, e em 21 de abril de 1109, na idade de 76 anos, entregou a alma para o descanso eterno. Numerosos e grandes milagres foram observados no seu túmulo. Um fidalgo, sofrendo de lepra, recuperou a saúde, tendo bebido da água em que o Santo tinha lavado as mãos, depois da celebração da santa Missa. O Papa Clemente XI deu a Anselmo o título honroso de Doutor da Igreja.
Reflexões
Santo Anselmo tinha pavor do pecado. "Se de um lado visse o pecado — dizia ele — e do outro as portas do inferno abertas, e devendo escolher entre um e outro, eu preferia lançar-me no inferno, sem cometer um pecado". Como Santo Anselmo pensam todos aqueles, que tem compreensão do pecado e de sua grande maldade. Qual é teu conceito em relação ao pecado? Tens dele pavor e aborrecimento? Melhor que a boca, teu modo de viver responder-te-á. Se com toda facilidade cometes pecados, onde está então o medo, o pavor de ofender a Deus? E medo, pavor do pecado não tens, porque te falta a compreensão da maldade dele. Que deves fazer para alcançar este pavor? Pedir a Deus, como o cego do Evangelho. "Senhor, fazei que veja!" Dai-me a graça de conhecer a maldade do pecado. "Conhecer e chorar os pecados é o início da salvação". (S. Jerônimo).
Santos, cuja memória é celebrada hoje
Na Pérsia, o bispo Simeão, e com ele grande número de fiéis arrebataram a palma do martírio por se terem negado a adorar o sol como divindade. Assim aconteceu no ano de 345, sob o governo do imperador Xapur.
Nos cárceres de Alexandria morreram o sacerdote Aratof e com ele Fortunato, Felix, Silvio e Vitalis, vítima da perseguição diocleciana.
Referência: Na luz Perpétua, 5ª. ed., Pe. João Batista Lehmann, Editora Lar Católico – Juiz de Fora – Minas Gerais, 1959.
Comemoração: 21 de abril.
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